Um tempo de ir ao cinema

Por Henrique Jasper

Do tempo que ir ao cinema era mais que assistir a um filme

Dia desses levei meus filhos ao shopping onde assistiriam O tempo e Vento, atual sucesso de bilheteria. Na volta, sozinho no carro, fui atropelado pela nostalgia dos tempos de piá. O sonho de todo guri, nascido na década de 60, era chegar aos 18 anos. Não apenas para “tirar a carteira” (de motorista), mas para ter acesso aos filmes “proibidos para menores”. Esta dificuldade foi driblada graças à amizade costurada com um argentino que locara o Cine Teatro Real, de Arroio do Meio – minha terra natal -, assim, podíamos ver os “filmes de mulher pelada”. O acesso à sala de exibição era uma operação típica do agente secreto 007. Exigia uma logística complicada, cercada de muito medo! Precisávamos  esperar o Canal 100, começar. Era um “noticioso” (como se dizia à época), cujo ponto alto para a piazada era o compacto, quase sempre de um velho jogo de futebol do Rio de Janeiro. Na hora do gol, a bagunça era geral.

Assim que começavam os trailers dos filmes, as luzes eram desligadas. Era a senha para que nós, um bando de adolescentes, pudesse acessar o mezanino do cinema, sob o projetor. Mal respirávamos, o silêncio era total, pisávamos suavemente para não chamar a atenção. Devidamente acomodados nas duras poltronas com assento e encosto de madeira, finalmente conseguíamos relaxar. Mesmo assim o pânico era permanente. Os “homens do Juizado de Menores” “davam incertas”. Com minúsculas lanternas de poderosos fachos de luz, pareciam dotados de uma espécie de detector de menores ou um sensor capaz de flagrar os guris mais nervosos cuja presença era proibida. O medo impedia que curtíssemos em toda plenitude as cenas tórridas, geralmente de filmes nacionais. O contorno de um seio, um biquíni mais ousado, o decote insinuante ou transparências impensáveis para a época eram suficientes para silenciar os baderneiros.

Vendo o seriado Malhação em pleno horário vespertino, lembrei deste tempo de censura doentia. Na tevê ou na internet tá tudo liberado, com imagens explícitas. Em bares, festas e automóveis o sexo deixou as salas escuras de projeção para ganhar as ruas, a mesa de jantar e as salas de aula.

Voltando à década de 70, lembro que outro momento delicado nas sessões proibidas era a saída. Era preciso deixar a sala antes das luzes serem acesas. Alguns arrumavam apressadamente a calça para disfarçar a tensão das emoções da noite e viravam alvo de gozação da galera. Quando os “maiores de idade” deixavam o cinema, os “de menor” já estavam no bar do Clube Esportivo, em calorosas discussões sobre as musas que povoavam nossas fantasias. Tudo regado com muito refrigerante!

FONTE: http://gilbertojasper.blogspot.com.br/